Confúcio Moura
Médico, escritor, cronista
educador e apaixonado por Rondônia

O poema sujo

O título é interessante: sujo. O autor é Ferreira Gullar. Maranhense de Alcântara. Foi exilado durante a ditadura militar na Argentina. Queria voltar e não podia. Era correr perigo. Ele começou o poema: “turvo turvo/ a turva mão do sopro contra o muro/ escuro/ menos menos/ menos que escuro/ menos que mole e duro/ menos […]

Ajustes e Desajustes

Nosso destino é feito de ajustes e desajustes. Vivemos o tempo da incerteza: um mundo em guerra, democracias sitiadas, políticas grotescas que soam como ecos — Trump, símbolos da sombra. O Brasil, ainda fechado em si mesmo, latino, preso às correntes do passado: a escravidão que ainda sussurra, o patrimonialismo que nunca nos deixa. Na […]

Será que eu sou louco?

Gosto de poesia. E por gostar, me pergunto: será que sou louco? Os poetas são trabalhadores como qualquer outro. Sua ferramenta é a palavra. Seu ofício: colocar a palavra certa no lugar certo, na hora certa — e, com isso, erguer mundos, costurar fantasias. Minha mãe dizia: “ninguém come poesia”. Para ela, poesia era coisa […]

Pintura por pintura

pintura por pintura: a cidade é bela, pintada de aquarela pena que meu sofrimento esteja ali no canto pintado de preto e branco amordaçado pelo jeu sorriso amarelo que acidentou o lado singelo da minha vida de recato Se eu bebo esperança todo dia é para não deixar a boca seca nestas avarias sentimentais de […]

O ato de pensar (poema)

O ato de pensar é para poucos corajosos Que jogam ao chão o escudo da hipocrisia para serem atingidos por mil pedras Que subirão sozinhos as montanhas, sem segurar nos pêndulos de sacos escrotais para ascenderem Que pouparão as cordas vocais ao se depararem com o grito da multidão fanática e idiotizada diante de deuses […]

Enchente 21/22

Morro abaixo, desce a lama, o barraco, a cama, o corpo, o choro chorado, o choro engolido, o choro morrido, o quase nada, perdido, inundado. A canoa na rua, o homem arrastado, o aflito, desabrigado, correnteza rolando a vida, a cesta básica, a roupa perdida. A dor da vida. Remando É o povo, o mesmo […]

O visto e o apagado

A comida a vontade, para poucos a comida contada para quase todos os comprimidos sem conta, os preços tão altos as doenças crônicas não vistas, leite do peito pingando outro leite secando o ronco no vazio do estômago a tripa engolindo a tripa de baixo o laço de fita na ilusão A mega-sena, a sena, […]

New York

Rondônia é de Rondon. Masculina e feminina. Como Ariquemes é do Misael Bezerra. Como eles têm muitos outros que fizeram da dor esta poesia, escrita com suor vermelho. Lá vem Ezequiel subindo o barranco do rio, ele que foi noteiro de garimpo. Nem sei como Cícero Cabeça de Pato fazia se mexendo nos seringais e […]

Teu olhar

Há tantas palavras em teus olhos que anulado é o silêncio insistente em sua boca. Que teimosa paixão adentra meu peito! Colecionadora de ilusões atrozes, dona de infundado sentimento ! Confesso aquilo que já não cabe, agora transcendental e lúdico. Não me furte ilusões doces até que as possa incorporar. Estava flutuante até abrir meus […]

A cidade (Ariquemes)

A cidade recomeçou. Ela já havia iniciado. Cresceu e diminuiu com os movimentos do dinheiro. Dinheiro faz cidades. Como o ouro. Como a madeira nobre. Como o látex.  A cidade ressurge, agora, pela posse da terra. O sonho da propriedade.  Pedaço de terra faz cidade também.  Ariquemes tem riqueza de sobra.  O Rio Jamari pode […]