Herança

Herança

Não tenho do que reclamar. Meu pai faleceu primeiro, em 1992, e me deixou de herança os seus óculos grossos e a carteira de identidade. Guardo-os até hoje. Com imenso orgulho.

Minha mãe morreu em 2011, nos guardados antigos da casa, dois casaquinhos bordados para minhas filhas, quando neném e panos de prato com arte. Ela exímia bordadeira. Foi uma herança e tanto, muito orgulho pelo patrimônio, que não poderia ser diferente.

Analisando o histórico evolutivo da pobreza, tem a frase secular, mortal – filho pobre, morre pobre. Ou filho de analfabeto quase sempre segue o pai. Não foi o meu caso – meu pai cursou as primeiras letras em Corrente no Piauí, o suficiente para tocar sozinho a vida e pegar gosto pela leitura de códigos e enciclopédias.

Minha mãe foi mais adiante, concluiu o curso primário em Barreiras – Bahia, na tradicional escola evangélica da Dona Juvinha, chegou até a tocar bandolim e aprendeu o ofício de datilógrafa, além das prendas pelas artes manuais em tecidos (bordados).

Família com oito (8) irmãos, salvos pela escola de freiras no sertão de Goiás (Tocantins). Cinco (5) dos filhos concluíram mais tarde seus cursos superiores em universidades federais. Cada um foi seguindo seu rumo. Trançando a vida como deve ser, saltando moitas, encafifando-se por vales e penhascos, com o suor do rosto, muita ousadia e ainda mais, coragem.

Estou aqui, agora, escrevendo este post, em breves palavras, satisfeito pela caminhada e fui indo, com imensa gratidão pela herança recebida, pelo exemplo do labor miúdo, do dinheiro curto, sobrevivendo dos instintos paterno e materno para criar a duras penas, prole tão numerosa.

Os óculos me fizeram enxergar mais longe, como binóculos, a carteira de identidade para não esquecer o escudo familiar, os panos bordados pelo o acolhimento, carinho que pode ser dispensado a cada um e termina que hoje, sou o homem mais rico da terra

 

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