Pioneiro

Pioneiro

Ser pioneiro em Rondônia, ser pioneiro em Ariquemes, era antes de tudo um gesto de atrevimento extraordinário. Você chegar, como eu cheguei, no início dos anos 1976, onde não tinha Ariquemes, não tinha nenhuma casa. Onde é a cidade hoje, só existia a Vila Velha de Ariquemes, ali havia umas palhoças na beira da BR-364, que não era asfaltada.

Quando eu cheguei ainda estavam se falando dos assentamentos dos projetos Marechal Dutra e Burareiro. As licitações não existiam. Estava todo mundo fazendo as medições topográficas, essas coisas.

Eu cheguei sozinho como médico e o único hotelzinho que tinha na cidade era o hotel do João Piauí, que ficava ali no Marechal Rondon, ali na Vila Velha, bem pertinho daqueles postos de combustíveis, na saída da cidade. E ali nós ficamos esperando no Hotel do Piauí. Era um hotelzinho de madeira, o nosso cinco-estrelas. Só tinha ele, se procurasse, não tinha outro, era ali, era o bom, era o ruim.

Ele servia o almoço e a janta, a família dele mesmo que cuidava. Fiquei ali quatro meses enquanto arrumava a “arapuquinha de madeira”, que no futuro chamei de Hospital São Francisco. Era um galpão de madeira, de cassiterita abandonado. Era muito comprido. Dividi a metade, me cederam lá, não tinha dono. Fiz uma reforma e me estabeleci.

Mandei fazer umas camas de madeira. O Tarciso, já falecido, esposo da dona Rosa, fez as caminhas de madeira. Arrumamos uns colchões, improvisamos tudo. Compramos um filtro de barro e ali fizemos um poço. Pegamos um rabicho de energia elétrica do INCRA, do Valter, tocava um pouquinho de luz à noite, e ali era um hospital.

Começamos a internar e atender gente. Eu também arrumei um emprego, no primeiro ano, pelo governo do território e fiquei atendendo no posto de saúde, lá na vilinha do Marechal Rondon, lá embaixo mesmo, na casa onde morava a família do enfermeiro, o seu Francisco Carlos. Ele ficava no fundo e nós ficávamos na frente, atendendo população.

Quando eu fui acertar a conta lá no hotel do Piauí, depois de quatro a cinco meses, eu falei – Sr. João, eu agora arrumei um cantinho para ficar ali perto do hospitalzinho, quero pagar o senhor. Ele falou – não doutor, não é nada não, nós estávamos era segurando você aqui pra ficar como médico para nós.

Ele não cobrou nada, mas eu paguei lá alguma gorjeta para ele. Certo é que fizemos uma grande amizade, junto com a família enorme. Ele viveu 102 anos. Faleceu neste ano de 2024, de velhice mesmo.

Então essa história do médico pioneiro não é fácil, depois eu conto mais histórias para vocês como foi a epopeia de ser pioneiro em Ariquemes.

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