Quando recebi a mijada de um gambá, imaginei, tudo na minha vida daria errado. Porque o bicho guarda um líquido fedido, mas tão fedido que pode se lavar com água corrente e sabão de barra que não tira o cheiro. Não havia outro jeito, porque já estava a caminho de Goiânia para iniciar uma outra vida. Estudar e trabalhar. Mas, me deu uma vontade de voltar pra casa.
Na vida tem estas coisas inesperadas. E como tem circunstâncias inexplicáveis, até mais que as previsíveis. Eu e outros colegas sertanejos, cada um puxava um rumo diferente, porque em nossa cidade do Goiás profundo (hoje, Tocantins) só havia estudo até quarta série (equivalente ao nono ano). Atravessava “os gerais”, na carroceria de um caminhão, boca da noite, um bichinho correu à frente, alguém bateu na boléia, eu, magricela ligeiro, saltei pensando que seria um tatu.
E não era. Mas, também se fosse, qual a necessidade de pegar o tatu? Se não tínhamos panela e nem intenção de cozinhar. Pulei em cima dele. Recebi o esguicho. Subi no caminhão com a cara lambida e ninguém me aguentou. Tive que ficar na rabeira da carroceria, até chegar num riacho para tomar banho.
Esfreguei o corpo como nunca na vida. Achei que havia tirado o fedor. A turma rindo de rolar. E eu, ali, de cara fechada e fedendo do mesmo jeito. Aquietei e fiquei pensando na vida. Este negócio não é de bom prenúncio. Deve ter um aviso pra mim, escondido neste cheiro horroroso. Fui me lavando aqui e ali. Como a viagem seria longa e o vento das veredas permanente, foi se dissipando a catinga.
Demorei esquecer o gambá. Hoje em dia, não posso nem falar o nome do bichinho, que começo a sentir aquele cheiro, que deve me rondar por cerca de cinquenta anos. Felizmente, não tive o mau agouro.