A arte de ceder

A arte de ceder

Desde os anos 80 que eu já vinha intrometendo na política. Indo aqui e ali a uma reunião do MDB. Usando a palavra para falar de democracia. Como se diz:  xeretando. Em 1992 meu pai foi me visitar em Ariquemes, onde eu exercia o ofício na medicina. Conversa vai, conversa vem, ele resolveu me contar uma história da experiência política dele.

Nos anos 40 ele foi eleito vereador em nossa cidade, Dianópolis -TO. Obteve 17 votos. Somando irmãos, pai dele e madrasta, 11 eleitores. Ele conseguiu mais 6 votos além dos votos de sangue. A Prefeitura não tinha dinheiro nenhum. Vereador não tinha o que fazer. O prefeito pegava a foice para roçar malva da praça. O maior assunto do debate político era o ataque das onças comendo bezerros.

Quando menos se espera, o deputado estadual benfeitor da região, conseguiu uma fanfarra para os eventos escolares. Tambores, tamborins, chocalho, reco-reco, alguns instrumentos de sopro. O prefeito atormentado pelos vereadores que nada faziam, resolveu deixar a guarda da “orquestra” sob a responsabilidade de um vereador, em rodízio, por 6 meses.

Tia Diana era a professora de toda a cidade. Alfabetizava e encaminhava os meninos pra frente. Respeitada. Admirada. Algum tempo depois, o deputado da região anunciou que viria à cidade para uma visita. Diana se apressou para preparar a escola para receber a ilustre personalidade. E pegou papel e caneta e mandou um bilhete para o meu pai (que estava encarregado da guarda da fanfarra): – “Zeferino, mande os instrumentos, para treinar os meninos, para receber deputado João de Abreu”.

Meu pai, no verso do mesmo bilhete, respondeu: – Diana, se quiser fazer festa, faça de berimbau.

Ela ficou decepcionada e esparramou a conversa pela cidadezinha de 6 ruas. A cidade ficou do lado dela, contra meu pai, que não teve quem o fizesse voltar atrás. Como se diz, o tempo dá voltas. Vieram as novas eleições. Meu pai, foi candidato, mesmo tendo 11 parentes eleitores, só obteve quatro (4) votos. E nunca mais conseguiu se alinhar na política.

Moral da história: ele me contou este acontecimento para dizer que a política é a arte de ceder, desde que não atrapalhe os seus planos. E que ninguém governa sozinho. Até parece que ele estava se despedindo, 30 dias depois da sua visita ele faleceu na cidade de Porto Velho e me deixou esta lição.

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