Conviver com a soja

Conviver com a soja

Este artigo, ou crônica, foi escrito há 17 anos. Quando Rondônia iniciava o plantio de soja e milho. Os bancos ainda eram tímidos. Eu era Deputado Federal e rodopiava o Estado.

1º de janeiro de 2004

Visitei as cidades do Cone Sul do Estado de Rondônia na semana passada. Ele é formado pelas cidades de Vilhena, Colorado do Oeste, Cerejeiras, Pimenteiras, Cabixi e Corumbiara. Fazem fronteiras com o Estado de Mato Grosso e outros com a Bolívia. O marco é o Rio Guaporé.

Tudo por ali era gado. De corte e leite. Ainda tem o maior rebanho do Estado. Mas, a paisagem está mudando, as lavouras de soja, arroz e milho mudaram o cenário. Apareceu um verde mais consistente, que chega humilhar a palidez do capim, com aquele amarelo fraco. E as roças descem à serra na direção de Colorado do Oeste, respeitando apenas os limites do impossível, dos aclives e declives, dos montes pedregosos e dos baixios inacessíveis. Quando se vê uma planura, lá está o arroz, milho e a soja.

Lógico que o Cone Sul não tem a dimensão de Mato Grosso, Goiás e Paraná, mas, a força da soja empurra o pasto para longe e ocupa o lugar. O que é de especial é que o agricultor encontrou um jeito de tocar sua vida, bem pouco precisa de banco. O crédito é insignificante. Banco da Amazônia é zero. Está orientado na extinta Medida Provisória 2.166 que exigia do agricultor a averbação da reserva legal em cartório. Hoje faz parte do Código Florestal. A Amaggi financia desde a semente, ao preparo do solo, assistência técnica e colheita. A conta é transformada em quilos de soja e na safra a empresa é paga. E tudo vai as mil maravilhas.

Lembro-me muito bem dos tempos do PRODECER (Programa de Desenvolvimento dos Cerrados), financiamento japonês para novas fronteiras agrícolas no Brasil.  Escolhidas as regiões de Paracatu, em Minas Gerais; Pedro Afonso, Tocantins; Balsas no Maranhão. E mais tarde, Barreiras, na Bahia, que não é do mesmo programa. Foram para lá gaúchos, paranaenses, paulistas e mudaram o cenário do sertão brasileiro que vivia da roça de toco para sobrevivência.

Agora, a lavoura de grãos palpita com força no Estado de Rondônia. Por certo, centenas de ecologistas estão com os nervos à flor da pele. “Vão destruir a Amazônia”. Mas, a coisa é irreversível e progressivamente irá subindo pelo Estado pelas savanas de Pimenta Bueno e áreas planas em todo o Estado.

Na mesma época do PRODECER veio a febre dos brasileiros para o plantio de soja na Bolívia, na região de Santa Cruz de La Sierra. Foram muitos, atraídos pela boa qualidade da terra e pelo financiamento fácil e acessível. Durou pouco o sonho dos brasileiros. Com os sucessivos movimentos da terra pelas máquinas, dos plantios e replantios, não tardou que tudo se desertificasse e por baixo aparecesse um resíduo de solo imprestável.  Quase tudo foi abandonado e o sonho virou pesadelo.

Visitei a EMATER da cidade de Cerejeiras e fui recebido pelo Técnico Agrícola Jocélio, que me disse que o início da produção de arroz e soja no município iniciou em 2002. Que o Banco da Amazônia está ausente por completo. Apenas financiou máquinas na feira de Vilhena. Todos os projetos agrícolas passam pela Emater, as terras estão bem valorizadas, mas, teme pela ausência do investimento e orientação ambiental, podendo mais tarde esta mesma terra se tornar desvalorizada pelos danos sofridos pelo mau uso.

Há de se considerar a fragilidade do solo e a consequente degradação. Falou como mestre – “a questão ambiental na região é antes de tudo uma opção econômica”, uma verdadeira profecia. Ninguém esbarra o homem quando a ele se descortina a oportunidade do lucro e da prosperidade. Mas, uma coisa é certa e imediata, a ação do Governo do Estado, através da Secretaria do Meio Ambiente, voltada para uma orientação em cada propriedade, sobre a aplicação conveniente da agricultura de grãos com a preservação do solo e das águas.

Jocélio profetizou com extrema sabedoria, cabe agora, o Governo do Estado regulamentar a política de licenciamento ambiental na propriedade, entrar no campo, ajudando e orientado os nossos agricultores, para que possamos ser exemplares para o Brasil e para o mundo, que ecologistas e desenvolvimentistas possam andar de mãos dadas. Para a felicidade de todos.

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