O idiota no restaurante francês

O idiota no restaurante francês

Nunca tinha visto falar a palavra cardápio. Ainda mais o significado dele. Meu costume, como “milico” era comer no racho do quartel. Tomar uma média de leite com café no Bar do João.  Um pão francês com manteiga. E, de vez quando, um pedaço de pudim de padaria. Lá vai o tempo passando. Evoluí muito. Passei a adorar pizza. Pizza média ou grande, quartejada em várias composições, muçarela, portuguesa, calabresa. Meu paladar foi se esmerando e se tornando exigente, saltando dos meus costumes de sertanejo, do cuscuz com leite, arroz com feijão, paçoca socada no pilão, para este mundo admirável de comidas da cidade grande.

Já era aluno do curso de medicina. Fazia “bico” como professor de cursinho, o Instituto Dom Abel em Goiânia, precisava subir na vida. Tinha planos. Nem sei como dava conta de fazer tanta coisa – plantão no necrotério do IML. Era auxiliar de necropsia. Tirando estas coisas, ainda cuidava da parte administrativa do cursinho e certo dia tive que ir à Brasília, levar documentos para o Deputado Anísio de Souza, para bolsas de estudo.

Desci do ônibus, carregava uma pasta, vesti camisa nova, corri as calçadas do Esplanada dos Ministérios, fiz o que tinha que fazer. Bateu a fome. Melhor se tivesse voltado à Rodoviária de Brasília, para subir e descer a escada rolante, que era uma emoção e procurar por ali, uma lanchonete, pedir um copo de caldo de cana e dois pastéis e mais um cachorro quente.

Mas, não. Me subiu uma mania boba, de que mereceria pela confiança, procurar um restaurante chic de Brasília, até mesmo para me exibir quando voltasse a Goiânia. Peguei um táxi e pedi – o senhor pode me levar a um restaurante francês? – Claro, cheguei. Um funcionário de paletó e gravata, me fez algumas perguntas, foi concordando com tudo. E me ofereceu uma mesa tão bonita, toalha, talheres, copos, guardanapos coloridos.

“O senhor está esperando mais alguém?”- Não senhor. Couvert? – Sim. Não sabia que seria couvert. Vieram cestas lindas de pães, melaços, manteigas e geleias. Comi tudo. Achei que o almoço seria somente o couvert. Veio o cardápio, tudo em francês. Eu já estava cheio de pães. Rapei tudo. Fiquei com vergonha de perguntar, sobre os pratos do cardápio. Botei o dedo em cima do quinto item. E demorou pra caramba.

Lá veio o prato principal fumegando frutos do mar. Lula, polvo e mexilhões. Outras bolotinhas que nem imagino o que seria. Olhei aquilo, dei uma cheirada discreta, toquei com a ponta do garfo, levei a boca, o negócio inchou, me deu embrulho no estômago. Olhei para um lado e outro, pedi a conta e peguei o ônibus de volta.

Imaginei no caminho – que negócio é este, de tanta fama que tem a cozinha francesa. Pude perceber que rico tem gosto estranho. E tratei de voltar aos meus costumes, por exemplo, uma tapioca com manteiga de garrafa, uma boa pamonha goiana. E esconjurei essas novidades.

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